Voltarà página principal

Aula 8

Introdução a Mecânica Quântica

  1.  Insuficiência da Física Clássica

        A aplicação da Mecânica e da Eletrodinâmica clássica aos edifícios atômicos e moleculares conduz rapidamente a conclusões insustentáveis, em total desacordo com a experiência. Assim, se as leis clássicas se aplicassem à um elétron gravitando em torno de um núcleo positivo, ele deveria irradiar continuamente ondas eletromagnéticas, em conseqüência, perderia energia até finalmente cair sobre o núcleo. Como sabemos, neste modelo tal como se encontra no átomo de hidrogênio, por exemplo, é estável e não irradia energia. Da mesma maneira é absolutamente impossível explicar a existência de moléculas a partir da Física Clássica.

        Esta situação foi o motivo de diversas tentativas no sentido de resolver as dificuldades encontradas. A teoria de Bohr para o átomo de hidrogênio (1910) é um exemplo de uma destas tentativas. Entretanto, como todas as teorias foram formuladas segundo os princípios da Física Clássica e sem possibilidade de generalização elas fracassaram completamente. Seria necessário repensar, então, toda a Física corpuscular.


Niels Bohr

        Foi o trabalho de Louis de Broglie que em 1924 lançou as bases de uma nova mecânica chamada ondulatória ou quântica (os dois qualificativos são sinônimos neste caso). Completada pelos trabalhos de Heisenberg, Schrödinger, Pauli, Dirac e outros mais, a Mecânica Ondulatória forma, em nossos dias, um conjunto coerente e apropriado ao tratamento de sistemas corpusculares necessitando, entretanto, de uma bagagem matemática considerável.

        Em 1924, Louis de Broglie, lembrando-se da natureza dualística dos fótons (sugerida por Einstein ao estudar o efeito fotoelétrico), e considerando que todos os fenômenos naturais envolviam certa forma de matéria e de radiação (ondas eletromagnéticas), sugeriu que assim como "as ondas de luz" tinham propriedades de partículas o inverso também deveria ser válido, isto é:
 

       "A toda partícula com momento linear p estaria associada uma onda de comprimento l, isto é : l= h/p, onde h é a constante de Planck e p o momento linear da partícula. Esta relação implicaria que todos os corpos massivos ou partículas, tais como uma bola de bilhar e um elétron, teriam também propriedades de ondas, cujas características seriam regidas pela mesma teoria das radiações. "


L. de Broglie

O comprimento de onda de De Broglie (l = h/p) foi escolhido de tal modo que a órbita de raio r contivesse um número inteiro n de ondas de matéria, ou seja,

De onde tiramos a quantização do momento angular, previamente postulado por Bohr,

       A natureza dualística da matéria era, então, sugestiva. A existência de ondas de matéria sugeria a possibilidade de se construir uma equação de onda que explicasse naturalmente o comportamento dos elétrons, átomos e moléculas. Neste sentido, em 1925, W. Heisenberg desenvolveu uma nova teoria quântica baseada no princípio da correspondência sugerido por Bohr. Heisenberg formulou sua teoria utilizando-se do cálculo matricial. Ironicamente, essa teoria escapou à atenção de muitos pesquisadores, devido a sua formulação matemática aparentemente complexa.
       Em 1926, quase ao mesmo tempo, E. Schroedinger publicou as suas idéias propondo uma nova teoria quântica. Formuladas de forma diferentes essas duas teorias são no entanto, idênticas quanto aos seus resultados. Hoje, quase dois séculos depois, essas teorias ainda constituem o esteio dos conceitos modernos da estrutura da matéria.
        Schroedinger, diferentemente de Heisenberg, foi levado a formular uma nova mecânica dentro da teoria ondulatória, a qual já era bem estabelecida. Ele tomou como base a equação de onda de d´Alembert que rege o movimento dos sistemas ondulatório no espaço e no tempo, a qual tem a forma:

 Levando em conta que as partículas, como por exemplo o elétron, se comportam como ondas, então seria de se esperar que a equação de d'Alembert também se aplicasse à descrição dos movimentos eletrônicos no átomo.
 

   2.  Princípios Gerais da Mecânica Quântica

        A Mecânica Clássica permite determinar a evolução de um sistema ao longo do tempo quando se conhece as condições iniciais e as forças agindo sobre o sistema. Em particular, pode-se prever, para cada elemento que constitui o sistema, a trajetória e a lei do movimento sobre esta trajetória. No caso da mecânica Newtoniana a cada instante, nós conhecemos a posição e a velocidade de cada partícula. Podemos então dizer que uma tal mecânica é determinista e muito ambiciosa. No universo microscópio das partículas, de acordo com o princípio da incerteza de Heizenberg, é impossível descrever perfeitamente o estado de um sistema, como por exemplo a posição e velocidade de um elétron no interior do átomo, simultaneamente.
       Tudo que nós podemos conhecer sobre o movimento de um sistema de partículas se reduz a uma função complexa Y dependente das coordenadas (x1, x2,..xN) das partículas e do tempo t. Esta função é chamada função de onda, advindo daí o qualificativo ondulatório dado a esta mecânica. De acordo com Max Born, esta função de onda não possui um significado físico, mas sim o quadrado de seu módulo:

                                                                1


(Y* = imaginário conjugado de Y ), representa a probabilidade de encontrar, no instante t as diversas partículas constituindo o sistema nos pontos de coordenadas x1, x2,...xN. Em outros palavras podemos dizer que a probabilidade de encontrar o sistema no instante t em um volume V do espaço (x1, x2,...xN) é dado por,

       ,                                                                                                                                            2

a integração sendo realizada sobre todas as coordenadas. Se o volume V é infinito, este volume contém certamente o sistema, então

 .                                                                                                                 3

        Esta condição fundamental chamada de condição de normalização da função de onda exige que a função Y seja de quadrado somável e em particular que ela seja zero no infinito.

        Na concepção clássica, uma partícula se encontra ou não, em um determinado instante, em um dado ponto do espaço. Pela Mecânica Quântica nós só podemos conhecer a probabilidade de encontrar a partícula no ponto considerado. O que leva a dizer que se repetirmos estas medidas simultaneamente sobre um número grande de sistemas idênticos e independentes (átomos em um gás diluído, por exemplo), representa a densidade de presença da partícula. Tudo se passa então - a nossa escala - como se as partículas tivessem perdido sua individualidade e fossem substituídas por uma nuvem contínua de densidade igual ao quadrado do módulo da função de onda correspondente. Desta maneira, à cada partícula se encontra associada uma função de onda, resumindo assim, tudo o que é possível saber sobre ela.

        O problema maior desta teoria é a determinação desta função de onda. Schrödinger (1926) mostrou que ela era solução de uma equação em derivadas parciais de segunda ordem, onde ele forneceu igualmente suas regras de construção. Será indicado em seguida os pontos essenciais relativos à construção desta equação e à estrutura das funções de onda.


E. Schrödinger

Para um sistema isolado, a função de onda pode ser separada da seguinte forma: 


                                                                 4


onde os termos  são os fatores espacial e temporal.

    Nesta equação E é a energia total do sistema, a qual é constante, visto que o sistema é isolado, h é a constante de Planck (6,6 x 10-27 c.g.s) e i é a parte imaginária. Y (x1, x2,...xN) é uma função de onda comportando apenas as variáveis espaciais. Esta função satisfaz a equação chamada de Equação de Schrödinger que pode ser escrita simbolicamente por: 

,                                                                                                                       5


H é designado um operador diferencial que transforma Y . Se multiplicarmos esta equação à esquerda por Y* e integrá-la em relação às variáveis espaciais, obteremos 

                                                                                     6

visto que Y é normalizada.

        Na prática, constrói-se o operador , algumas vezes chamado Hamiltoniano, substituindo na expressão clássica para a energia total de um sistema constituído de N partículas, as quantidades de movimento px associado as coordenadas cartesianas x, pelos operadores diferenciais:

  .                                                                                                    7


        Para um sistema de partículas j de massas respectivas mj, a energia total E é a soma da energia cinética (T) e a da energia potencial (V). A energia cinética é função das velocidades que por sua vez pode ser expressa em função das quantidades de movimento, assim,

  ,                                                  8


onde pxj , pyj e pzj são as componentes do vetor quantidade de movimento da partícula j, isto é,

                                                                                                                    9


        A resolução da equação  fornece a função de onda em termos do parâmetro E que é a energia total do sistema. Como vimos, a condição de normalização exige que esta função seja de quadrado somável. O estudo matemático das soluções da equação de Schrödinger mostra que esta condição é realizada somente para certos valores discretos de E. Em outros termos, a energia inicial de um sistema não pode ser arbitrariamente imposta como na Mecânica Clássica.

        As funções Yi de quadrado somável são ditas auto-funções do operador H cujas energias associadas Ei são denominadas de auto-valores deste operador.

            Pode-se mostrar igualmente que as funções de onda Yi , soluções da equação de Schroedinger acima, são ortogonais, isto é:

                                                                             10

onde dmn é a delta de Dirac.

            O conhecimento da função de onda determina completamente o sistema no ponto de vista da mecânica quântica. Na realidade, as mesmas regras de construção relativas ao operador Hamiltoniano associado à energia se aplicam à uma grandeza qualquer. A expressão clássica desta grandeza corresponde a um operador F; o resultado da medida macroscópica sendo dada por

                                                                                                     11

 

   3.   Interpretação da Mecânica Ondulatória e seus Postulados

        Schödinger, para introduzir a sua formulação para a Mecânica Quântica se baseou no modelo da Mecânica Ondulatória Clássica. A idéia básica era encontrar uma equação equivalente a equação de Hamilton para a mecânica clássica.
        No caso de um sistema de N partículas, por exemplos elétrons, assume-se que a energia potencial é função somente das coordenadas :

                                                                                                 12

Como a energia total do sistema (E) é igual a soma das energias cinética e potencial, temos que, 

                                                                  13

Na mecânica quântica substituímos as quantidade de movimento pelos seus operadores correspondentes, como a seguir 

                                                                                          14

 Assim temos que 

                                                                                                    15

 

O operador energia equivalente ao clássico (eq.13) pode ser obtido usando a equação 15, como a seguir
 

                                                                              16

ou

                                        17

onde  é o operador Laplaciano relativo à partícula j, isto é,

.                                                                                                               18

Assim a equação de Schrödinger (eq.5) assume a forma

                                                                                     19

 

   4.  O princípio de Mínima Ação e a equação de Schrödinger

        Na seção 3, discutimos o princípio de mínima ação ou princípio de Hamilton. Na mecânica clássica, a variação da integral de ação resulta em uma equação diferencial que, uma solucionada, fornece todas as informações do sistema em estudo. Portanto, espera-se que a variação de uma integral equivalente forneça uma equação que descreva completamente o sistema quântico, a qual será denominada de equação de Schrödinger.  Desta forma a equação de Schrödinger pode ser deduzida da mesma maneira que a equação de Euler-Lagrange, discutida na seção 3, utilizando para isto o método variacional.

        Para formular o problema variacional na mecânica quântica, considere a integral de ação:

                                                                                                        20

em que    é o operador Hamiltoniano atuando na função de onda Y. Esta integral expressa o valor esperado da energia (E). Mas, o problema quântico está vinculado à normalização da função de onda com apresentado na equação (3). Portanto, será necessário a utilização do método dos multiplicadores de Lagrange para se efetuar a variação, já que a equação (3) é uma equação de vínculo ou condição que a função de onda deve satisfazer. Assim, sabendo que , tem-se

                                             (21)

ou ainda,

                                                         (22)

em que apenas subtraiu-se zero na equação (20). Aplicando a variação na equação (22), em que l é o multiplicador de Lagrange, tem-se que

                                  (23)

Neste caso o multiplicador de Lagrange  l é uma constante, assim dl = 0. Re-escrevendo a equação (23) obtemos,

                     (24)

 As funções de onda Y e Y* variam de forma independente. Desta forma, a condição dS = 0 fornece duas equações diferenciais equivalentes, do tipo,

   ,                                                                                (25)

que é a própria equação de Schrödinger não dependente do tempo.

 

Em resumo podemos escrever alguns dos postulados da nova Mecânica como,

i.                     A todo sistema corresponde uma função de onda 

ii.                   A função de onde deve ser de quadrado integrável e normalizada,

iii.                  A seguinte correspondência existe entre as variáveis dinâmicas e os seguintes operadores:
 

Variáveis              Operadores


 

Voltar à página principal

Voltar ao início desta página


    O conteúdo desta página está em constante atualização.
Correções no texto e sugestões serão bem vindas.

Electronic Address :  kcmundin@unb.br
Last Updated: Aug/07/2007
Copyright 1997: Kleber C. Mundim. All rights reserved.
Register No  169.766 - Biblioteca Nacional - Ministério da Cultura
phone: 55 71 237 2033     FAX 55 71 235 5592